Lançado em 1975, Gil & Jorge: Ogum, Xangô não é apenas um álbum; é uma obra-prima espontânea da música brasileira, que floresceu da química inegável entre dois gigantes: Gilberto Gil e Jorge Ben Jor. Gravado nos Phonogram Studios, no Rio de Janeiro, o disco transcende a ideia de um mero registro, capturando a energia vibrante de uma jam session improvisada e entregando um material autêntico e visceral da musica popular brasileira.

Este álbum é singular por suas faixas estendidas, muitas ultrapassando os 10 minutos, onde riffs de guitarra hipnóticos, percussão precisa e linhas de baixo envolventes tecem um diálogo constante e fascinante entre os músicos. Entre esses momentos de pura genialidade, “Nêga” se destaca. Na sua edição do disco duplo em vinil, a canção é uma das que vão além dos 10 minutos, transformando a letra original de Gilberto Gil (já gravada em seu álbum londrino de 1971) em uma brincadeira sonora descontraída. É nessa improvisação, com trocas de palavras e grooves intermináveis, que a palavra “Cabo Frio” surge e é repetida insistentemente, marcando um dos pontos mais curiosos do álbum:

"Nêga, Cabo Frio, Nêga, Cabo Frio, Nêga, Blue sky, blue sea, Cabo Frio, blue, Cabo Frio..."

Essa passagem hipnótica, que você pode ouvir neste link do YouTube.

Mas o disco vai muito além do virtuosismo técnico. Ele pulsa com a alegria, a malandragem e a inconfundível brasilidade que são a assinatura de Gil e Jorge. A espontaneidade da gravação, realizada praticamente sem overdubs ou ensaios extensos, confere a Ogum, Xangô uma vibração orgânica e crua, quase como se o ouvinte estivesse imerso na mesma sala com os artistas, testemunhando a criação em tempo real.

Embora tenha passado um tanto despercebido comercialmente em seu lançamento, hoje Gil & Jorge: Ogum, Xangô é universalmente reconhecido como um marco incontestável da MPB. Sua inovação sonora, a coragem artística e a autenticidade do processo criativo o elevam a um patamar de culto. A capa do álbum, que une simplicidade e impacto visual, reflete perfeitamente o caráter intimista e genuíno desse projeto atemporal.

No mesmo ano, Gil e Jorge ainda lançariam dois importantes álbuns de suas carreiras individuaisRefazenda — o primeiro disco da trilogia “Re” — e Solta o Pavão, segundo trabalho da fase psicodélica e mística de Jorge Ben, que inclui também Tábua de Esmeralda (1974) e África Brasil (1976). Essa coincidência revela o auge criativo que ambos viviam naquele período.

Em suma, Ogum Xangô é uma celebração da criatividade sem amarras, provando que a música brasileira pode ser simultaneamente sofisticada, experimental e profundamente popular. Um clássico essencial que continua a inspirar músicos e ouvintes, ecoando sua magia décadas após ter sido gravado.

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